Modelos de Feedback Interpessoal: Revisão de Literatura Científica
- Dr. Galiano Brazuna Moura
- 18 de mar.
- 16 min de leitura
Atualizado: 20 de mar.
Modelos de Feedback Interpessoal: Revisão de Literatura Científica

Feedback interpessoal refere-se ao processo de uma pessoa fornecer informações a outra sobre seu desempenho, comportamento ou impacto, com o objetivo de promover compreensão mútua e melhoria. A seguir apresenta-se uma revisão das evidências científicas sobre o tema, abrangendo modelos teóricos, revisões sistemáticas, estudos empíricos e aplicações práticas em diversos contextos.
1. Modelos Teóricos Feedback Interpessoal
Vários modelos teóricos de feedback interpessoal têm sido propostos para explicar como o feedback funciona e quais fatores influenciam sua eficácia. Dentre os mais reconhecidos na literatura acadêmica, destacam-se:
Teoria da Intervenção de Feedback (FIT) – Kluger & DeNisi (1996): Um modelo seminal derivado de uma meta-análise de 131 estudos, que definiu feedback como “ações de um agente externo para fornecer informação sobre algum aspecto do desempenho de uma tarefa”
. Essa teoria sugere que o efeito do feedback depende de em que nível de atenção ele incide – por exemplo, no nível da tarefa ou no nível do “eu” do receptor. Feedback focado na tarefa (informações sobre como melhorar a tarefa) tende a ser mais efetivo do que feedback centrado na pessoa (por exemplo, elogios ou críticas à pessoa)
. A FIT também ajudou a explicar por que, em certos casos, o feedback pode reduzir o desempenho: se a informação leva o indivíduo a focar em si mesmo (ameaçando sua autoestima) em vez da tarefa, o efeito pode ser negativo
. Em suma, Kluger e DeNisi enfatizaram que o impacto do feedback é altamente variável e contextual, dependendo de como é formulado e percebido.
Modelo de Feedback de Hattie & Timperley (2007) – Este é considerado um dos modelos mais influentes no campo educacional
. Hattie e Timperley propuseram que um feedback eficaz deve responder a três perguntas-chave: “Onde estou indo?” (quais são as metas? – feed-up), “Como estou indo?” (qual meu desempenho atual em relação à meta? – feed-back) e “Onde ir em seguida?” (o que fazer para melhorar? – feed-forward)
. Além disso, eles distinguiram quatro níveis de feedback: (1) nível da tarefa – informações sobre quão bem a tarefa foi executada; (2) nível do processo – dicas sobre o processo ou estratégias para realizar a tarefa; (3) nível de autorregulação – comentários que ajudam o indivíduo a autoavaliar e autorregular seu trabalho; e (4) nível do self – feedback dirigido à pessoa em si (por exemplo, elogios genéricos)
. O modelo sugere que feedback nos níveis de processo e autorregulação geralmente têm maior potencial de melhorar o aprendizado, enquanto feedback no nível de self (ex.: “Muito bem, você é inteligente!”) tende a não aprimorar o desempenho na tarefa
. Os autores enfatizam que o propósito fundamental do feedback é reduzir a discrepância entre o estado atual e a meta desejada
.
Figura: Modelo de feedback de Hattie e Timperley (2007) mostrando que o propósito do feedback é reduzir discrepâncias entre a compreensão/desempenho atual e um objetivo desejado. O modelo propõe que um feedback eficaz responda a três perguntas essenciais (“Onde estou indo?”, “Como estou indo?”, “Onde ir em seguida?”) – correspondendo a feed up, feed back e feed forward – e que cada pergunta opere em quatro níveis: tarefa, processo, autorregulação e self
.
Feedback e Autorregulação – Butler & Winne (1995): Este modelo, ancorado na teoria da aprendizagem autodirigida, descreve o feedback como um processo interativo em que o aprendiz gera feedback interno ao monitorar seu progresso e recebe feedback externo que informa seu desempenho
. Butler e Winne enfatizaram que estudantes comparam continuamente seu estado atual em relação às metas e ajustam estratégias com base tanto em sinais internos quanto em informações externas
. Assim, o feedback não é visto apenas como algo “feito ao aluno” pelo outro, mas como parte integrante do ciclo de autorregulação do próprio aprendiz. Esse modelo, bem citado na literatura educacional, ajudou a explicar diferenças nos efeitos do feedback ao nível cognitivo e motivacional
.
Feedback como Processo Social e Dialógico – Modelos mais recentes destacam o caráter interpessoal e colaborativo do feedback. Por exemplo, abordagens como as de Carless & Boud (2018) propõem que feedback efetivo envolve um diálogo entre quem dá e quem recebe, em vez de uma comunicação unidirecional. Nessa linha, enfatiza-se o conceito de “literacia de feedback”, isto é, a capacidade do indivíduo de compreender, internalizar e utilizar o feedback recebido. Modelos contemporâneos consideram o receptor como agente ativo: o aprendiz está no centro do processo, podendo inclusive buscar feedback ativamente e gerar auto-feedback
. Essa mudança de perspectiva – do feedback para o aprendiz para o feedback pelo aprendiz – reflete teorias construtivistas e vem ganhando força nos últimos anos
.
Outros modelos e tipologias incluem, por exemplo, classificações de estilos de feedback (como o “feedback sanduíche” vs. feedback direto) e protocolos específicos usados em certos campos (como as regras de Pendleton em educação médica, que estruturam a conversa de feedback). Em resumo, a literatura teórica oferece múltiplos enquadramentos, mas converge na ideia de que o feedback interpessoal eficaz é específico, contextualizado e deve ser parte de um processo contínuo de comunicação entre as partes envolvidas
.
2. Revisões Sistemáticas
A eficácia do feedback interpessoal tem sido examinada em várias revisões sistemáticas e meta-análises nos últimos anos, as quais sintetizam os achados de muitos estudos:
Meta-análises clássicas vs. recentes: Uma meta-análise clássica conduzida por Kluger & DeNisi (1996) analisou 131 estudos (com mais de 12 mil participantes) e encontrou um efeito médio positivo do feedback sobre o desempenho (coeficiente ~0,38). No entanto, de forma surpreendente, cerca de 1/3 dos efeitos foram negativos, indicando casos em que o feedback piorou o desempenho
. Esses resultados pioneiros chamaram atenção para a variabilidade do impacto do feedback e para a importância de moderadores (por exemplo, o conteúdo do feedback, ou características do receptor). Já uma meta-análise mais recente de grande porte (435 estudos, >61.000 participantes) revisitou o tema e encontrou um efeito médio de magnitude moderada (d ≈ 0,48) do feedback no aprendizado dos estudantes
. Essa análise contemporânea, conduzida por Wisniewski, Zierer & Hattie (2020), confirmou que “feedback não pode ser entendido como uma intervenção uniforme”, dada a alta heterogeneidade dos resultados
. Os autores mostraram que o impacto varia substancialmente conforme o conteúdo da informação fornecida e o tipo de resultado observado – por exemplo, efeitos maiores em desempenho cognitivo e de habilidades motoras, e efeitos menores em aspectos motivacionais ou comportamentais
. Em geral, tais revisões reforçam que o feedback, quando bem empregado, tem papel positivo significativo, mas seus efeitos dependem de como e quando é dado
.
Revisões integrativas de modelos: Além de avaliar efeitos, pesquisadores têm revisado a literatura para mapear modelos e teorias de feedback. Lipnevich & Panadero (2021) realizaram uma revisão sistemática que identificou 14 modelos teóricos proeminentes de feedback educacional
. Nessa revisão, os autores descrevem cada modelo, seu contexto de surgimento e evidências de suporte, oferecendo uma visão histórica da evolução do conceito de feedback. Eles concluem que, ao longo das décadas, o campo moveu-se de uma visão de feedback como informação corretiva simples para concepções mais abrangentes, que incluem elementos como contexto, engajamento do aprendente e interação social
. Em um trabalho complementar, Panadero & Lipnevich (2021) propuseram um modelo integrativo (chamado MISCA, do acrônimo em inglês Message, Implementation, Student, Context, Agent) que sintetiza elementos comuns a diversos modelos de feedback
. Essa abordagem integrativa ajuda a clarificar componentes essenciais do feedback (por ex., a mensagem em si, como é implementada, características do estudante, contexto situacional e agentes envolvidos).
Outras revisões específicas: Há também revisões sistemáticas focadas em contextos particulares. Por exemplo, no ambiente organizacional, revisões têm examinado práticas de feedback 360 graus (em que múltiplas fontes – pares, subordinados, superiores – avaliam um profissional). Uma revisão de literatura de intervenções de 360° sugere que essa abordagem, quando voltada para o desenvolvimento (e não punição), pode melhorar competências de liderança e autoconsciência dos gestores
. No campo da saúde/educação médica, revisões destacam a importância do feedback estruturado na formação de habilidades clínicas, embora apontem desafios em equilibrar feedback honesto e motivador para residentes e estudantes de medicina
. Em psicoterapia, meta-análises de sistemas de feedback de progresso do paciente (como o feedback-informed treatment) mostram pequenos a médios benefícios adicionais ao se fornecer retorno estruturado ao terapeuta e paciente sobre a evolução do tratamento
. Em suma, as revisões sistemáticas sustentam a importância do feedback interpessoal em múltiplas áreas, ao mesmo tempo em que alertam para a necessidade de estratégias adequadas para maximizar seus benefícios.
3. Estudos Empíricos
Pesquisas empíricas têm investigado em detalhes como diferentes abordagens de feedback funcionam e quais são mais eficazes. Alguns achados notáveis incluem:
Formato e conteúdo do feedback: Estudos experimentais compararam técnicas distintas de fornecer retorno. Um exemplo famoso é o “feedback sanduíche” – sequência em que feedback positivo é dado, seguido de crítica construtiva, e finalizado com outro elogio. Apesar de ser amplamente recomendado em manuais populares, a evidência empírica é questionável. Um estudo com estudantes de medicina mostrou que os alunos acreditavam que o feedback em formato sanduíche melhorava seu desempenho, porém os dados indicaram que não houve ganho objetivo de performance em relação a feedback direto
. Em outras palavras, o “sanduíche” parece melhorar a percepção do feedback (deixando-o mais palatável), mas não necessariamente o aprendizado ou desempenho resultante
. De modo semelhante, pesquisas em contextos organizacionais têm criticado o método do “sanduíche”, observando que alternar elogios genéricos e críticas pode diluir a mensagem principal e confundir o receptor
. Por outro lado, estudos apontam alternativas mais eficazes, como o modelo SBI (Situação-Comportamento-Impacto), no qual o feedback é estruturado descrevendo a situação, o comportamento observado e seu impacto – proporcionando clareza e objetividade.
Tempo (timing) do feedback: A questão do momento em que o feedback é oferecido também foi objeto de investigação. Uma meta-análise reportou que, em certas condições, feedback imediato (logo após a tarefa) pode não ser tão benéfico quanto se supunha – em contextos de aprendizagem complexa, feedback retardado (dado após um intervalo) mostrou efeitos superiores
. A interpretação é que feedback imediato, embora previna a repetição de erros, às vezes pode impedir que o aprendiz reflita por si próprio; já um breve atraso permite processamento cognitivo e consolidação antes de receber a correção. Entretanto, o timing ótimo depende do tipo de atividade: em tarefas simples ou procedurais, feedback imediato costuma ser mais útil, enquanto em tarefas conceituais pode ser vantajoso dar algum tempo para autorreflexão antes do retorno
.
Feedback informativo vs. genérico: A qualidade informativa do feedback é crucial. Evidências indicam que simplesmente dizer se algo está certo ou errado tem impacto limitado, ao passo que fornecer uma explicação ou dica de melhoria gera aprendizado significativamente maior
. Por exemplo, em ambientes educacionais, alunos que recebem explicações sobre por que sua resposta está incorreta (e como corrigi-la) apresentam ganhos mais robustos do que aqueles que recebem apenas “correto/incorreto” como retorno
. De maneira geral, feedback específico e orientativo (que aponta caminhos para melhora) supera feedback genérico, tanto no desempenho imediato quanto na retenção de longo prazo
.
Valência (positivo vs. negativo): Diversos estudos exploraram como feedback negativo (crítico) versus positivo (elogioso) impacta o receptor. Sabe-se que o feedback negativo honesto é fundamental para correção de erros, mas também pode evocar reações defensivas. Experimentos em contexto organizacional mostram que pessoas frequentemente reagem mal a críticas: diante de feedback desfavorável, indivíduos tendem a contestar a avaliação, diminuir a meta, desconsiderar ou mesmo distorcer o conteúdo para algo mais positivo
. Essas reações de defesa reduzem a eficácia do feedback, pois em vez de estimular a melhoria, servem para proteger a autoestima do receptor. Isso não significa que o feedback deva ser apenas positivo – a omissão de críticas importantes também é prejudicial. A literatura indica que o ideal é equilibrar empatia e franqueza: feedback corretivo deve focalizar o comportamento (não o caráter), vir acompanhado de sugestões construtivas e ser dado em um contexto de confiança
. Também é útil encorajar o receptor a refletir sobre o feedback e elaborar um plano de ação, aumentando a aceitação. Quando bem conduzido, feedback corretivo pode gerar mudanças significativas; do contrário, pode ser ignorado ou até produzir efeito contrário.
Diferenças de contexto e cultura: Estudos empíricos também revelam que a eficácia do feedback interpessoal pode variar com fatores contextuais e culturais. Por exemplo, em culturas organizacionais de baixa confiança, mesmo feedback bem intencionado pode ser recebido com ceticismo. Já ambientes “feedback-friendly” – onde há tradição de diálogo aberto – colhem melhores resultados, pois os indivíduos encaram o feedback como suporte em vez de crítica pessoal. Pesquisas interculturais apontam que sociedades mais individualistas (ex.: EUA) tendem a valorizar feedback direto e individual, enquanto sociedades coletivistas (ex.: alguns países asiáticos) preferem abordagens mais indiretas e que preservem a “harmonia” do grupo ao dar críticas. Essas nuances ressaltam que não há abordagem universal; modelos de feedback eficaz precisam ser adaptados às dinâmicas interpessoais de cada contexto.
Em suma, a pesquisa empírica confirma que “como” o feedback é dado importa tanto quanto seu conteúdo. Feedback bem projetado – oportuno, específico, equilibrado entre reforço positivo e orientações de melhoria – está associado a melhores resultados de aprendizado, desempenho e satisfação
. Por outro lado, abordagens mal concebidas podem falhar ou até ser contraproducentes, reforçando a necessidade de aplicar princípios baseados em evidências na prática do feedback interpessoal.
4. Aplicações Práticas
Os modelos e evidências sobre feedback interpessoal encontram aplicações em diversos contextos práticos, dentre os quais destacam-se:
Ambiente de Trabalho (Organizações)
No contexto profissional, o feedback é uma ferramenta essencial de gestão de desempenho, desenvolvimento de talentos e clima organizacional. Aplicações típicas incluem: avaliações de desempenho periódicas, programas de feedback 360° (coleta estruturada de opiniões de colegas, subordinados e superiores) e coaching de liderança. Pesquisas mostram que criar uma cultura de feedback contínuo traz múltiplos benefícios às empresas. Por exemplo, dados de consultorias indicam que 80% dos funcionários que receberam um feedback significativo na última semana se dizem plenamente engajados no trabalho
. Ou seja, o engajamento e a motivação tendem a ser maiores quando as pessoas recebem retornos frequentes e relevantes sobre seu desempenho. Em vez de se limitar à revisão anual, muitas organizações estão implementando práticas de feedback frequente e “em tempo real” (“continuous feedback” ou “fast feedback”), nas quais gestores dão retornos curtos e específicos no dia a dia
. Essa abordagem ágil permite que equipes façam ajustes imediatos e melhorias incrementais, aumentando a rapidez de aprendizagem e a produtividade
. Também se observa maior inovação em ambientes onde os colaboradores se sentem seguros para dar feedback aos gestores (“voz ativa”) e onde o reconhecimento por bom desempenho é prontamente oferecido.
Por outro lado, nas relações hierárquicas, feedback corretivo mal conduzido pode gerar insatisfação ou quebra de confiança. Estudos em psicologia organizacional apontam que um clima de confiança e respeito é pré-condição para que empregados aceitem e ajam conforme feedback crítico
. Assim, empresas de sucesso investem no treinamento de líderes para fornecer feedback de modo respeitoso, objetivo e focado em soluções, evitando ataques pessoais ou julgamentos vagos. Técnicas como SBI (mencionada acima) e modelo GROW (muito usado em coaching) são comumente empregadas para dar estrutura às conversas. Em suma, no ambiente de trabalho moderno, o feedback interpessoal deixou de ser apenas uma etapa burocrática de avaliação e passou a ser encarado como um processo contínuo de desenvolvimento – uma via de mão dupla que, se bem utilizada, impulsiona desempenho, engajamento e aprendizado organizacional
.
Educação (Ensino e Treinamento)
Em contextos educacionais, do ensino básico à universidade, o feedback é considerado um dos fatores mais influentes na aprendizagem do aluno
. A noção de avaliação formativa – na qual professores fornecem feedback constante para guiar o progresso do aluno – é hoje parte integrante das boas práticas pedagógicas. Revisões abrangentes (como a de Black & Wiliam, 1998, e meta-sínteses de Hattie, 2007/2009) firmaram que “o efeito positivo do feedback no desempenho dos estudantes não é mais disputado”
. Alguns exemplos de aplicação: professores comentando trabalhos e provas com orientações específicas de melhoria; colegas revisando o trabalho uns dos outros (peer feedback); e uso de ferramentas tecnológicas que dão feedback imediato em exercícios.
A pesquisa educacional enfatiza que o feedback eficaz deve ser claro, específico e construtivo. Em sala de aula, isso significa ir além de marcar erros: é importante explicar por que algo está errado e como corrigi-lo
. Por exemplo, em vez de apenas anotar “Resposta incompleta” em uma questão, um professor pode escrever: “Você identificou corretamente a primeira parte, mas faltou explicar a relação X; releia o conceito Y e tente conectar ao caso”. Esse tipo de retorno orienta o aluno sobre o que fazer para melhorar, caracterizando o feed-forward destacado por Hattie & Timperley
. Outra aplicação prática é fomentar a autoavaliação e o feedback entre pares: alunos aprendem a criticar construtivamente o trabalho dos colegas e, com isso, também desenvolvem senso crítico em relação ao próprio trabalho. Estudos mostram que envolver o aluno ativamente no processo (em vez de ele ser apenas um recebedor passivo de notas) aumenta o engajamento e promove a autorregulação da aprendizagem
.
Em ambientes de treinamento corporativo ou cursos profissionalizantes, princípios similares se aplicam. Instrutores eficazes dão feedback imediato em desempenhos práticos, ressaltando pontos fortes e pontos a melhorar de forma equilibrada. Em treinamentos técnicos ou esportivos, por exemplo, o feedback frequentemente assume a forma de demonstração e correção: o treinador observa a execução, fornece comentários específicos (às vezes acompanhados de demonstração de como fazer corretamente) e pede ao aprendiz para tentar novamente incorporando o ajuste. Essa iteração contínua feedback-ajuste é crucial para aquisição de habilidades. Vale notar que elogios genuínos por progresso (“vejo que você aplicou a técnica X corretamente desta vez, parabéns!”) funcionam como reforço positivo, aumentando a confiança do aprendiz, enquanto feedback corretivo imediato previne a consolidação de hábitos errados.
Terapia e Contextos Clínicos
No campo da psicologia e saúde mental, o feedback interpessoal aparece em duas vertentes principais: (1) no relacionamento terapeuta-cliente e (2) em sistemas formais de feedback de progresso clínico. Na relação terapêutica, terapeutas frequentemente dão feedback aos pacientes – por exemplo, comentando padrões de comportamento observados ou progressos alcançados – e também recebem feedback dos clientes sobre o que está ou não funcionando na terapia. A literatura sugere que terapeutas que acolhem ativamente o feedback do paciente tendem a ter melhores resultados, pois ajustam a abordagem conforme a necessidade individual. Uma abordagem conhecida é a Terapia Informada por Feedback (Feedback-Informed Treatment, FIT), na qual são utilizadas escalas padronizadas em cada sessão para o cliente avaliar seu estado e a aliança terapêutica, fornecendo ao terapeuta dados objetivos sobre o progresso. Meta-análises têm demonstrado que adicionar esses sistemas de feedback no tratamento resulta em taxas mais altas de melhora e menores índices de desistência da terapia
. Especificamente, uma revisão de 10 meta-análises concluiu que monitorar sistematicamente a evolução do paciente e retroalimentar o terapeuta/paciente tem efeito benéfico de pequena a média magnitude na eficácia do tratamento, com destaque para redução de casos de estagnação ou piora não identificados precocemente
.
No que tange ao feedback do terapeuta para o cliente, aplicações práticas incluem dar devolutivas em intervenções diagnósticas (por ex., comunicar resultados de testes psicológicos de forma compreensível e útil ao cliente) e reforçar avanços durante a terapia (“Observe como você lidou melhor com aquela situação esta semana em comparação à anterior”). Um cuidado importante, segundo os especialistas, é que o feedback terapêutico seja validante e empático – mesmo ao apontar dificuldades, o terapeuta deve fazê-lo de modo a não provocar vergonha ou resistência excessiva no cliente
. Por exemplo, ao invés de dizer “Você não está se esforçando para mudar”, o terapeuta pode enfatizar o aspecto positivo: “Percebo que mudar esse hábito tem sido difícil; que obstáculos você sente que estão no caminho?”, abrindo espaço para o cliente refletir. Essa postura colaborativa alinha-se com pesquisas mostrando que aliança e confiança são mediadores cruciais: o feedback dentro da terapia é mais efetivo quando ocorre em um vínculo de respeito mútuo. Em terapias de casal ou família, técnicas de feedback estruturado (como fazer cada parte parafrasear e confirmar que entendeu o que o outro expressou) ajudam a melhorar a comunicação e reduzir mal-entendidos, aumentando a satisfação relacional
.
Relacionamentos Interpessoais (Vida Cotidiana)
Fora dos contextos formais de trabalho, escola ou terapia, o feedback interpessoal permeia nossas relações cotidianas – entre amigos, cônjuges, pais e filhos, etc. Nesses casos, não falamos de “modelos” estruturados, mas dos princípios de comunicação eficaz aplicados às interações do dia a dia. Pesquisas em comunicação interpessoal sugerem que trocas honestas e respeitosas de feedback fortalecem relacionamentos, aumentando a compreensão mútua e a confiança
. Por exemplo, em uma amizade, saber dar um toque gentil sobre um comportamento inconveniente (e.g., “às vezes você tem chegado atrasado e isso nos preocupa”) pode prevenir ressentimentos acumulados. Da mesma forma, em relacionamentos amorosos, psicólogos recomendam a prática da comunicação não-violenta, que envolve expressar necessidades e frustrações sem culpar o parceiro – essencialmente uma forma de feedback sobre como as ações do outro nos afetam. Estudos longitudinais com casais demonstram que habilidades de comunicação, incluindo dar feedback positivo (elogiar, apreciar) e feedback construtivo em conflitos, correlacionam-se com maior satisfação marital e menor probabilidade de divórcio a longo prazo
. Em contraste, padrões negativos crônicos – como críticas pessoais severas ou desprezo (conforme descritos nos “Quatro Cavaleiros” de Gottman) – destroem a qualidade relacional. Assim, aplicar os princípios de feedback interpessoal significa, no cotidiano, saber equilibrar sinceridade e delicadeza. Uma estratégia prática é concentrar-se em comportamentos observáveis e em como você se sente em relação a eles, ao invés de julgar a pessoa. Por exemplo: “Fiquei magoado por você não ter me contado o que aconteceu naquele dia; valorizo muito nossa confiança e gostaria que pudéssemos conversar sobre isso” – aqui a pessoa comunica o impacto (magoado), reafirma a importância da relação (valorizo nossa confiança) e convida ao diálogo, em vez de atacar o caráter do outro. Esse tipo de feedback abre espaço para ajuste mútuo no relacionamento: o outro tem a chance de explicar sua perspectiva ou modificar seu comportamento, fortalecendo a intimidade e entendimento do casal ou amigos
.
Em contextos familiares, pais eficazes usam feedback positivo para incentivar comportamentos desejados nos filhos (“Você arrumou seu quarto, bom trabalho!”) e feedback construtivo/disciplinar de forma consistente porém amorosa (“Entendo que você ficou bravo, mas bater não é aceitável; vamos achar outra forma de mostrar seus sentimentos”). Esse equilíbrio de reforço e limite, segundo pediatras e psicólogos, favorece o desenvolvimento emocional saudável da criança. De modo geral, as pesquisas apontam que relacionamentos interpessoais prosperam quando há abertura para feedback bilateral – ou seja, todos se sentem ouvidos e seguros para expressar sentimentos e impressões – criando um ciclo de confiança.
5. Referências
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